a edição

Depois de publicado Terra do pecado, em 1947, seu primeiro romance, José Saramago passaria um intervalo de quase vinte anos sem publicar nenhum outro livro. O que não quer dizer que o escritor durante todo esse tempo não tenha escrito. Do contrário. Inéditos expostos em A consistência dos sonhos, exposição organizada pelo curador espanhol Fernando Gómez Aguilera, deu contas de que nesse período Saramago foi tão polígrafo quanto no período no qual se consagra escritor. Esboço de poemas, contos, romances inacabados, resenhas, crônicas, peças de teatro, enfim, uma leva de materiais escritos que dão contas de um Saramago que buscava, em todos os territórios da escrita, um lugar próprio. E o encontrou. Tardiamente, como romancista. Mais precisamente em 1980, com o romance Levantado do chão. Antes, porém, depois do longo verão das publicações, a 'reestreia' se dá em 1966, e vem através de um gênero no qual o autor nunca será reconhecido pelo tal: a poesia. Entretanto, da extensa obra deixada por José Saramago que temos conhecimento, convém sublinhar que, também a poesia, se constitui num naco significativo no âmbito do conjunto completo da sua produção literária. Para efeito, citem-se: Os poemas possíveis - o referido livro de 'reestreia' literária do escritor, publicado naquela que, à época, foi a mais importante coleção de poesia portuguesa, a coleção Poetas de hoje; Provavelmente alegria, em 1970; e O ano de 1993, publicado em 1975, que é o que podemos chamar de sua assinatura oficial ao fim da produção no gênero. Fruto de uma “fabricação poética” (para usar os termos do próprio escritor em entrevista a Carlos Reis, 1998), todo esse material seria revisto mais tarde por Saramago e republicado não só com um certo número de rasuras, mas também com um certo número de emendas. Entendendo que, antes de ser espaço-prólogo de escrita, isto é, de ensaio para composição da obra que se estende pós-poesia, a obra poética de José Saramago tem, coerentemente, um significado para o quadro da poesia portuguesa contemporânea e, consequentemente, na produção literária do escritor. Trata-se, no entanto, de uma das zonas de criação do escritor menos explorada ou pelo menos ainda não estudada com profundidade, seja pela crítica brasileira, seja pela crítica estrangeira. A concepção e a elaboração desse número especial do Caderno-revista 7faces pretende chamar atenção para esta parte da obra de José Saramago e pretende ser um espaço para um diálogo acerca desse material poético do escritor português e recebe textos que, no seu âmbito, se propõem a discutir a poesia e aspectos concernentes à poesia do escritor. A ideia dessa edição nasce ainda em junho de 2010. Ao longo desse período uma série de ações foi realizada, dentre as quais, cito a inauguração do espaço Um caderno para Saramago, a realização do concurso Uma página para Saramago, a realização dos cursos Um universo de José Saramago – paisagens e Diagnósticos do presente em José Saramago, Chico Buarque e Jorge Reis-Sá. Esta edição que o leitor tem agora em mãos é, pois, fruto de um esforço de longa data e coletivo e, antes de ser um trabalho de leitura para uma face menos escura da literatura saramaguiana, uma homenagem que tem por interesse perpetuar uma obra que foi e é um acontecimento relevante para o universo das literaturas em expressão portuguesa.



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